MELODRAMA CIRCENSE

Em pouco tempo, na década de 30, surge a segunda geração do circo-teatro.
Os adaptadores passaram à condição de autores, criando uma dramaturgia original, com um estilo de linguagem próprio: o melodrama circense, que atingia a platéia dos circo-teatros atendendo às necessidades de seu imaginário, com jovens apaixonados, vilões terríveis e angústias maternas, em uma linguagem brasileira.
A chamada terceira geração surgiu a partir do final da década de 1950 com o declínio do circo-teatro tradicional, e atingiria seu auge nas décadas de 60 e 70.
Seja pelas inúmeras crises financeiras, seja pela perda de grande contigente de bons atores para a televisão, ou por mudanças no perfil e "gosto" do público, as maiores empresas de circo-teatro decidiram suspender a parte teatral para voltar a investir no circo tradicional.
Funcionários desses circos acabaram comprando o material de cena e figurinos e, sem condições de contratarem um elenco de artistas circenses e sem habilidades para executarem eles mesmos os números acrobáticos, fundaram circos que eram destinados quase que exclusivamente às encenações teatrais.
Geralmente, estes circos apresentam uma primeira parte reduzida a uns poucos quatro ou cinco números circenses muito simples e uma segunda parte com uma peça, baseada nos dramas tradicionais ou chanchadas, onde o palhaço do circo atua caracterizado, como nas comédias de picadeiro anteriores à estruturação do circo-teatro.

DRAMATURGIA

Uma das características mais fortes do melodrama é a rigorosa oposição de vontades e interesses de dois grupos de personagens, definidos claramente em seu antagonismo como os bons e os maus e que agem firmemente dentro de suas premissas na busca por seus objetivos.
Essa bipolaridade também se faz presente no encadeamento das ações e suas conseqüências, na sempre presente perseguição dos bons e pelos maus, fazendo com que a trama se desenvolva em uma constante alternância entre momentos de euforia e tristeza, tranqüilidade e desespero, esperança e angústia, levando sempre à esperada punição dos maus, mas nem sempre à felicidade dos bons.

MELODRAMA SÉCULO XIX

As de desfecho infeliz eram as de maior sucesso entre o público no período áureo do melodrama, justamente porque não satisfaziam a expectativa de felicidade gerada durante o desenrolar da trama, instigando a reflexão e a discussão do público sobre os pontos que poderiam ter tido soluções diferentes, tornando a peça intensamente comentada.
Ivete Huppes sintetiza as matrizes temáticas do melodrama em dois núcleos: a reparação da injustiça e a busca da realização amorosa.
Ambos podem estar entrelaçados, como no caso de E O CÉU UNIU DOIS CORAÇÕES, em que estão igualmente presentes e ligados em sua origem.
No desenvolvimento desses temas, como recurso inerente ao melodrama e catalisador das fortes emoções, estão as revelações: não há melodrama sem surpresas.
Seja por meios de cartas, pelo reconhecimento de objetos ou traços pessoais, as revelações são um recurso fundamental para o autor, que pode alterar o rumo da trama quantas vezes e de quantas maneiras lhe convier, em busca do maior impacto sobre a platéia.
Desse modo, o autor joga com infinitas possibilidades para sua trama, na qual filhos desaparecidos, irmão separados, testamentos secretos, testemunhas de crimes e cartas extraviadas, são algumas das peças disponíveis para cada novo mosaico.
No melodrama, o público está diante de uma longa sucessão de nós, desenlaces e pequenos climaxes que se encadeiam até o clímax final, em um arremate geralmente espetacular, apoteótico.
Outro aspecto importantíssimo é a diferença entre os antagonistas na condução da trama e construção dos personagens: geralmente os personagens maus são muito mais audaciosos e impetuosos, fazendo com que os bons assumam seu papel heróico por oposição.
Toda ação é impelida pela perseguição, por alguma atitude cruel ou ardil que trará conseqüências que mobilizarão os outros personagens.
De fato, o segredo para um bom melodrama está na consistência de seu vilão, cuja magnitude cruel e inescrupulosa sustenta o fio de iminente desgraça que nos faz torcer pelos heróis.
É bastante freqüente que o vilão seja alguém próximo de um dos heróis, sendo seu parente ou tutor, ampliando a dimensão de suas maldades em contraste com a afeição que lhe é dedicada.

RECURSOS

Alguns recursos são muito empregados no melodrama na busca pelo maior impacto emocional sobre a platéia. O uso de punhal ou veneno na morte ou ameaça de morte dos heróis, cenas em prisões, calabouços e masmorras e a morte do ente querido, justamente quando se alcança o sucesso na busca pela justiça e punição dos maus, são exemplos recorrentes em diversas obras, repetindo-se como códigos que balizam a recepção. Assim, a previsibilidade de muitas situações transforma-se em elemento catártico, dando ao público a sensação de um poder divinatório ou de perspicácia ao tomarem, como descobertas, frutos de seu raciocínio investigativo, o reconhecimento de conflitos recorrentes, apenas recontextualizados entre novos personagens.
Entre as figuras típicas do melodrama encontramos, freqüentemente, e como em E O CÉU UNIU DOIS CORAÇÕES, além do vilão como tutor do herói, donzelas órfãs e idosos fragilizados ou injustiçados pelas maldades do vilão.
No circo-teatro era empregada uma nomenclatura particular para os tipos ou personagens, sendo que a maioria dos atores atuava sempre em papéis semelhantes nas diversas montagens, especializando-se em tais tipos, classificados da maneira que se segue:

- o personagem mau ou vilão era chamado de cínico
- o herói, de galã
- a heroína , de ingênua
- o personagem cômico masculino é chamado de cômico o feminino, de caricata
- o parceiro do cínico é chamado de comparsa
- a figuração, com ou sem pequenas falas, de comparsaria


Pimenta, Daniele. Antenor Pimenta e o Circo-Teatro Rosário: Uma História do Circo-Teatro no Brasil. Dissertação apresentada como exigência parcial para obtenção do título de Mestre em Artes Cênicas. Universidade de São Paulo - Escola de Comunicações e Artes - Departamento de Artes Cênicas. São Paulo. 2003

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